quarta-feira, 27 de abril de 2011

To Be Or Not To Be - Parte II



HAMLET: Ser ou não ser... Eis a questão. Que é mais nobre para a alma: suportar os dardos e arremessos do fado sempre adverso, ou armar-se contra um mar de desventuras e dar-lhes fim tentando resistir-lhes Morrer... dormir... mais nada... Imaginar que um sono põe remate aos sofrimentos do coração e aos golpes infinitos que constituem a natural herança da carne, é solução para almejar-se. Morrer.., dormir... dormir... Talvez sonhar... É aí que bate o ponto. O não sabermos que sonhos poderá trazer o sono da morte, quando alfim desenrolarmos toda a meada mortal, nos põe suspensos. É essa idéia que torna verdadeira calamidade a vida assim tão longa! Pois quem suportaria o escárnio e os golpes do mundo, as injustiças dos mais fortes, os maus-tratos dos tolos, a agonia do amor não retribuído, as leis amorosas, a implicância dos chefes e o desprezo da inépcia contra o mérito paciente, se estivesse em suas mãos obter sossego com um punhal? Que fardos levaria nesta vida cansada, a suar, gemendo, se não por temer algo após a morte - terra desconhecida de cujo âmbito jamais ninguém voltou - que nos inibe a vontade, fazendo que aceitemos os males conhecidos, sem buscarmos refúgio noutros males ignorados? De todos faz covardes a consciência. Desta arte o natural frescor de nossa resolução definha sob a máscara do pensamento, e empresas momentosas se desviam da meta diante dessas reflexões, e até o nome de ação perdem. Mas, silêncio! Aí vem vindo a bela Ofélia. Em tuas orações, ninfa, recorda-te de meus pecados.

OFÉLIA Como tem passado, príncipe, no correr de tantos dias?

HAMLET: Muitíssimo obrigado; bem, bem, bem.

OFÉLIA: Tenho algumas lembranças suas, príncipe, que há muito devolver eu desejara; receba-as, por favor.

HAMLET: Eu, não; eu, não; eu nunca te dei nada.

OFÉLIA: O príncipe bem sabe que é verdade, e com palavras de tão doce anélito, que o valor dos presentes aumentava. Mas, evolado o aroma, agora os trago. Os brindes se empobrecem, para uma alma bem-nascida, de par com os sentimentos de quem os dá. Ei-los aqui, meu príncipe.

HAMLET: Ah! Ah! És honesta?

OFÉLIA: Como assim, príncipe?

HAMLET: És bela?

OFÉLIA Que quer dizer Vossa Alteza com isso?

HAMLET: É que se fores, a um tempo, honesta e bela, não deves admitir intimidade entre a tua honestidade e a tua beleza.

OFÉLIA Mas, príncipe, poderá haver melhor companhia para a beleza do que a honestidade?

HAMLET: Realmente, que a beleza, com o seu poder, levaria menos tempo para transformar a honestidade em alcoviteira do que esta em modificar a beleza à sua imagem. Já houve época em que isso era paradoxo; mas agora o tempo o confirma. Cheguei a amar-te.

OFÉLIA: Em verdade, o príncipe me fez acreditar nisso.

HAMLET: Não deverias ter-me dado crédito, porque a virtude não pode enxertar-se em nosso velho tronco, sem que deste não remanesça algum travo. Nunca te amei.

OFÉLIA: Tanto maior é a minha decepção.

HAMLET: Entra para um convento. Por que hás de gerar pecadores? Eu, de mim, considero-me mais ou menos honesto, mas poderia acusar-me de tais coisas, que teria sido melhor que minha mãe não me houvesse dado à luz. Sou orgulhoso, vingativo, cheio de ambição, e disponho de maior número de delitos do que de pensamentos para vesti-los, imaginação para dar-lhes forma, ou tempo para realizá-los. Para que rastejarem entre o céu e a terra tipos como eu? Todos somos consumados velhacos; não deves confiar em ninguém. Toma o caminho do convento. Onde se encontra teu pai?

OFÉLIA: Em casa, alteza

HAMLET: Que lhe fechem as portas, a fim de impedirem que faça papel de tolo, a não ser em sua própria casa. Adeus.

OFÉLIA: Ajuda-o, céu de bondade.

HAMLET: Se tiveres de casar, dou-te por dote a seguinte maldição: ainda que sejas casta como o gelo e pura como a neve, não escaparás à calúnia. Vai; entra para o convento; adeus. Ou então, se tiveres mesmo de casar, escolhe um néscio para marido, porque os assisados sabem perfeitamente em que monstros as mulheres os transformam. Para o convento, vai; e isso depressa. Adeus.

OFÉLIA: Poderes celestiais, restituí-lhe a razão!

HAMLET: Conheço muito bem vossas pinturas; Deus vos deu um rosto e arrumais outro; andais aos pulinhos e com requebros, falais cheias de esses e dais nomes indecentes às criaturas de Deus, fazendo vossa leviandade passar por inocência. Vai; não insisto, porque foi isso que me deixou louco. O que digo é que não teremos casamentos; os que já são casados, com exceção de um, hão de continuar vivos; os de mais, prosseguirão como estão. Para o convento; vai!


(Sai.) OFÉLIA: Que nobre inteligência assim perdida!

O olho do cortesão, a língua e o braço do sábio e do guerreiro, a mais florida esperança do Estado, o próprio exemplo da educação, o espelho da elegância, o alvo dos descontentes, tudo em nada! E eu, a mais desgraçada das mulheres, que saboreei o mel de suas juras musicais, ter de ver essa admirável razão perder o som, qual sino velho, essa forma sem par, a flor da idade, fanada pela insânia! Ó dor sem fim! Ter já visto o que vi, e vê-lo assim!

 
Now listening: No Good For Me, by The Corrs.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

To be, or not to be...





Cena III

Um quarto em casa de Polônio.  Entram Laertes e Ofélia.

LAERTES: Tudo o que é meu já se acha a bordo; adeus. Cara irmã, se houver ventos benfazejos e navios no porto, não te ponhas a dormir: dá notícias.

OFÊLIA: E duvida-o?

LAERTES: O que respeita a Hamlet, e seu namoro, toma-o como capricho, simples moda, violeta que a estação produziu cedo, passageira e aromosa, não durável, perfume e refrigério de um minuto, nada mais.

OFÉLIA: Nada mais?

LAERTES: Isso, mais nada. Nosso corpo, ao crescer, não ganha apenas volume e músculos; o templo expande-se, e a par, também, se alarga o espírito e a alma com seu culto interior. É bem possível que te ame agora, sem que fraude alguma lhe macule a virtude do alvedrio. Mas deves ter cautela, que os de sua posição não são donos de si mesmos. Ele é escravo do próprio nascimento; não pode, como o faz gente do povo, eleger para si, que dessa escolha depende a segurança e o bem do Estado. Daí, necessitar subordiná-la ao voto e aprovação do corpo, cuja cabeça ele é. Se te disser que te ama, cumpre à tua prudência dar-lhe crédito na medida em que seja permitido passar do verbo à ação, o que mais longe não irá do que a voz da Dinamarca. Pensa na mancha, irmã, para tua honra, se desses ao seu canto ouvido crédulo e o coração perdesses, ou se abrisses o teu casto tesouro aos seus assaltos. Cuidado, irmã! Cuidado, Ofélia amiga! Fica na retaguarda dos anseios, a coberto dos botes dos desejos. Já prodigalidade é uma virgem revelar a beleza à própria lua. Da calúnia a virtude não se livra. Muitas vezes, o verme estraga as flores primaveris, bem antes de se abrirem. No orvalho e na manhã da mocidade o vento contagioso é mais nocivo. Sê cautelosa; o medo é amparo certo. A mocidade é imiga de si mesma.

OFÉLIA: Encerrarei no peito, como guardas, essas sábias lições. Mas, caro irmão, não faças como alguns desses pastores que aconselham aos outros o caminho do céu, cheio de abrolhos, enquanto eles seguem ledos a estrada dos prazeres, sem dos próprios conselhos se lembrarem.

LAERTES: Nada receies; mas é tempo; aí vem nosso pai.

(Entra Polônio.)

Dupla bênção, graça dupla. O acaso me concede este outro adeus.

POLÔNIO: Ainda aqui, Laertes? Para bordo! O vento se acha a tergo de tua vela; já te reclamam. Vai com a minha bênção, e grava na memória estes preceitos: Não dês língua aos teus próprios pensamentos, nem corpo aos que não forem convenientes. Sê lhano, mas evita abastardares-te. O amigo comprovado, prende-o firme no coração com vínculos de ferro, mas a mão não calejes com saudares a todo instante amigos novos. Foge de entrar em briga; mas, brigando, acaso, faze o competidor temer-te sempre. A todos, teu ouvido; a voz, a poucos; ouve opiniões, mas forma juízo próprio. Conforme a bolsa, assim tenhas a roupa: sem fantasia; rica, mas discreta, que o traje às vezes o homem denuncia. Nisso, principalmente, são pichosas as pessoas de classe e prol na França. Não emprestes nem peças emprestado; que emprestar é perder dinheiro e amigo, e o oposto embota o fio à economia. Mas, sobretudo, sê a ti próprio fiel; segue-se disso, como o dia à noite, que a ninguém poderás jamais ser falso. Adeus; que minha bênção tais conselhos faça frutificar.

LAERTES: Humildemente me despeço, senhor.

POLÔNIO: O tempo é curto; vai logo, que os criados já te esperam.

LAERTES: Adeus, Ofélia; guarda o que eu te disse.

OFÉLIA: Guardei-o na memória, e a chave a levas.

LAERTES: Adeus.

(Sai.)

POLÔNIO: Que palavras, Ofélia, ele te disse?

OFÉLIA: Se o permitis, falou de lorde Hamlet.

POLÔNIO: Ah, bem pensado. Já me disseram que ele te dispensa alguma intimidade e que tu própria tens sido liberal em dar-lhe ouvidos. Se é assim, de fato - o que me revelaram à guisa de advertência - devo ser-te franco: não te comportas com a prudência que compete à minha honra e à minha filha. Que é que há entre vós dois? Fala a verdade.

OFÉLIA Senhor, ultimamente fez-me muitas propostas de afeição.

POLÔNIO: Ora, afeição! Falas tal qual mocinha inexperiente do perigo de certas situações. E tu? Acreditas em tais propostas?

OFÉLIA: Não sei como pensar, meu pai, sobre isso.

POLÔNIO: Ouve, então: é preciso que não passes de um bebê, para teres recebido como moeda corrente essas propostas. Propõe agora juízo, se não queres - e a pobre frase o agüenta - para tolo me propor.

OFÉLIA: Mas senhor, sua insistência sempre foi de moral honrosa e digna.

POLÔNIO: Moral! Bela expressão. Adiante! Adiante!

OFÉLIA: E ele soube firmar os seus protestos de amor com os mais sagrados juramentos.

POLÔNIO: Conheço isso; armadilha para tordos. Sempre que o sangue ferve, à língua os votos que a alma não regateia vêm e esplendem com mais luz que calor para extinguirem-se à só promessa frustros antes do ato. Não os tomes por fogo. Doravante restringe a tua virginal presença; náo deves pôr muito elevado preço nessas propostas, como se ordens fossem para parlamentar. Enquanto a Hamlet, confia nele até este ponto: é moço, sobre dispor de corda bem mais frouxa, para andar, do que a tua. Em suma, Ofélia, descrê dos seus protestos; são agentes que desmentem a cor do hábito externo, mendigos de desejos inconfessos, que respiram candura e santidade para melhor lograrem. Novamente e em termos simples: doravante proíbo-te que sejas perdulária de teu ócio, pondo-te a conversar com lorde Hamlet.

Vê bem que o ordeno. E agora, põe-te a andar.

OFÉLIA Ser-vos-ei obediente.

Now listening: No Good For Me, by The Corrs

A estrela do Navio

A orientação pelas estrelas é um dos métodos naturais mais antigos, em todas as civilizações. As constelações mais usadas pelos Escoteiros, no Hemisfério Norte, são a Ursa Maior, Ursa Menor, Orion e a Cassiopeia. Já no Hemisfério Sul, é o Cruzeiro do Sul quem orienta os navegantes.

Na fantástica viagem que iniciei no dia 30 de maio de 1981, é você quem tem feito às vezes de constelação orientadora. E quer saber? Nunca fiquei à deriva. E é maravilhoso ter você comigo!

Feliz Aniversário, mãe! Preciso dizer?


Now listening: Ode To My Family, by The Cranberries

PetroCity

Voltando à série viagens fantásticas...




Jorge de Altinho, cantor e compositor pernambucano, é um dos artistas que melhor retratam a beleza do meu estado. Já cantou o Rio Una, descrevendo todo o seu trajeto desde a sua nascente, no município de Capoeiras, no agreste meridional, passando por Altinho, Agrestina, Palmares, até chegar "no meio do mar". Já cantou a sua terra natal, Altinho, descrevendo a sua infância na Fazenda Santo Antônio. E cantou a jóia do Sertão Pernambucano, o encontro das duas cidades irmãs, separadas apenas pelo Rio São Francisco, nos seguintes versos:

"Nas margens do São Francisco nasceu a beleza
E a natureza ela conservou
Jesus abençoou com sua mão divina
Pra não morrer de saudade vou voltar pra Petrolina

Do outro lado do rio tem uma cidade
Que na minha mocidade eu visitava todo dia
Atravessava a ponte, mas que alegria
Chegava em Juazeiro, Juazeiro da Bahia

Ainda me lembro dos meus tempos de criança
Esquisita era a carranca e o apito do trem
Mas achava lindo quando a ponte levantava
E o vapor passava num gostoso vai-e-vem

Petrolina, Juazeiro
Juazeiro, Petrolina
Todas as duas eu acho uma coisa linda
Eu gosto de Juazeiro
E adoro Petrolina."


Estive em Petrolina, no último final de semana, visitando Jeronne, amigo de 16 anos atrás. E, se eu pudesse, fazia como cantou o Jorge: para não morrer de saudade (não só do amigo, mas da cidade), voltaria para Petrolina. A jóia do Sertão Pernambucano, maior exportador de frutas do estado, capital da vinicultura, compõe, junto com Juazeiro, na Bahia, um dos cenários mais bonitos que já vi em minha vida.

O clima é quente durante todo o dia, e esfria vertiginosamente a noite, característica do semi-árido nordestino. O cultivo de frutas, a indústria, um dos maiores portos fluviais do Brasil, e o turismo, têm injetado desenvolvimento à cidade, que não pára de crescer. A orla fluvial da cidade me lembra muito o Bairro de Boa Viagem, na capital, com vários edifícios altos e luxuosos. Gastronomia bem característica da região com dois pólos famosos: o Galinhódromo - onde se come galinha de cabidela, ou assada, com feijão de corda, arroz ou baião de dois - e o Bodódromo, onde a especialidade, como o próprio nome já sugere, é o bode, assado ou cozido (guisado). E vários passeios para o seu entretenimento, como as travessias para a Ilha do Rodeadouro, e outras Ilhas no meio do Rio São Francisco. Ah! E não esqueçam de comer um peixinho, pescado lá mesmo e tratado e preparado pelos bares nas margens do Rio. Diversão garantida, e o cenário, é de tirar o fôlego!

Now listening: Velho Chico, by Geraldo Azevedo.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

"Olha, será que ela é moça, será que é de vidro, o rosto da atriz?"



Era o dia 14 de abril de 2007. Assim como este ano, chovia torrencialmente em Recife. E às 09h50min você nasceu. Sua gestação tinha sido complicada, mas mesmo assim, você nasceu forte, saudável, uma criança tranquila, e linda. Ouso afirmar inclusive que não havia bebê mais lindo do que você no berçário (coisas de madrinha coruja).

Fui eu quem dei a sugestão do seu nome. E acredito que não haja outro mais apropriado. Beatriz, bem vinda; aquela que traz alegria para as pessoas. E desde o seu primeiro choro você não tem nos trazido outra coisa, além de muita alegria. Soprou novo fôlego, nova vida, dentro do meu coração partido, magoado, dos percalços da vida.

Você é pequenininha ainda, não sabe ler, nem escrever. Mas tenho certeza de que, daqui a alguns anos, quando isso for possível, você vai sentir a emoção transbordando destas linhas que escrevo agora, com lágrimas nos olhos.

Meu amor, minha princesinha, minha bonequinha... Que a felicidade que hoje você me traz se multiplique infinitamente por toda a sua vida! Que este seu sorrisinho que me encanta e me enternece sempre possa adornar o seu rosto. Madrinha vai estar sempre, sempre, do seu lado, aconteça o que acontecer. Nunca esqueça de quem você é, e que você foi concebida com muito amor!


Now listening: Little Star, by Madonna.