domingo, 26 de dezembro de 2010

A Mulher de Pilatos - Hymen Hymenalus (Antoinette May)

"Era uma recepção discreta - apenas alguns convidados -, nada parecida com o estilo de Agripina. Por quê? - perguntei a mim mesma, porém não por muito tempo. Pilatos estava lá. Ele era tudo o que importava. (...)



Meu olhar se encontrou com o dele. Pilatos me observava. Estremeci de prazer. Quando ele me dava aquele sorriso lento, parecia que tinha um mel derretido escorrendo pelas minhas costas. Ele cumprimentou o centurião com quem conversava e, em poucos passos, atravessou a grande sala. Acomodando-se num banco almofadado junto ao meu divã, cochichou em meu ouvido:

- Dizem que, mais cedo ou mais tarde, toda mulher fica com o rosto que merece.
Intrigada acompanhei seu olhar até um canto em que mamãe entretinha os convidados, no centro de um pequeno círculo de amigos.

- Ela ainda é muito bonita - disse Pilatos.
- E bonita por dentro também - acrescentei -, mas é preciso conhecê-la para descobrir isso.

Ele fez sinal para um escravo que passava, pegou duas taças de vinho e me entregou uma.
- Você tem a beleza dela e algo mais... um toque de mistério. Ninguém sabe exatamente no que está pensando. Você tem isso e... - inclinou-se para perto, tornando a cochichar - ...talvez uma certa malícia. Às vezes acho que gosta de criar problemas só para se divertir.
- Talvez - admiti.

Atrás dele, vi Germânico aproximar-se. Carregava uma lira embaixo do braço. Que amolação! Eu não queria que ninguém nos interrompesse.
- Dispensei os malabaristas - explicou Germânico. - O pesadão deixou cair a tocha duas vezes. E, depois, o barulho que eles fazem, toda aquela gritaria... Eu gostaria que você cantasse, Cláudia, como costumava fazer na Gália. Faz muito tempo que não ouço sua voz encantadora, tempo demais.(...)

Dedilhando alguns acordes, sussurrei uma prece a Ísis e comecei. Primeiro, uma leve paródia militar que sempre divertia Germânico. Depois, ganhando confiança, uma balada popular que parodiava a fábula de Leda e seu amado cisne. Pilatos chegou mais perto, sorrindo. Desviando meus olhos dos seus, vi as expressões de tédio cortês se transformarem em surpresa. (...)"

Now listening: No Good For Me, by The Corrs.

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